H.P. Lovecraft concebeu, nos seus escritos, toda uma mitologia envolvendo deuses alienígenas antigos, cuja influência é essencialmente destrutiva e cujo contacto leva, muitas vezes, à loucura.
Esse conjunto de histórias, conhecido como Cthulhu Mythos (ou Mitos de Cthulhu) inclui elementos que se tornaram icónicos na literatura, tais como o titular Cthulhu (uma criatura que é um misto de cefalópode com dragão e que hiberna no fundo dos mares), o Necronomicon (um livro cuja leitura leva, invariavelmente, à desgraça do leitor, normalmente enlouquecendo-o), cultos de divindades proibidas, e que se inserem num género apelidado de terror cósmico.
Se a minha descrição parece simplista, é porque o é. Um par de parágrafos não chega para transmitir a complexidade e a essência desse mundo de histórias, desenvolvidas por Lovecraft e por outros escritores ao longo de décadas (alguns deles, como August Derleth, amigos dele), e que foram expandidas, adaptadas ou homenageadas não só na literatura como noutros meios, tais como o cinema, a banda desenhada, os videojogos e mesmo em canções (como são exemplo "The Call Of The Ktulu" e "The Thing That Should Not Be", ambas dos Metallica).
De qualquer modo, não é esse o meu objectivo aqui...
Pretendo apenas falar de uma das múltiplas adaptações dos Mitos: uma série de BD da BOOM! Studios entitulada "Cthulhu Tales".
A série consiste em várias edições com contos, posteriormente agrupados num Omnibus em dois volumes ("Delirium" e "Madness").
Algumas das histórias são escritas por nomes "fortes" da BD, tais como Steve Niles, Keith Giffen e Mark Waid, e focam essencialmente temas "clássicos" dos Mitos, tais como o enlouquecimento dos leitores do Necronomicon, a invasão da Terra pelos deuses alienígenas e os cultos a Cthulhu & Cia.
Outras, como "Cthulhu Calls" e "Comeback Tour", usam uma abordagem humorística mas bem engendrada: enquanto na primeira temos um sujeito que fez um ritual de invocação parcial para chamar Cthulhu e depois não se consegue livrar dele "apesar de não ter chegado à terceira base", numa alegoria divertida aos encontros falhados em que a rapariga não deixa o rapaz sossegado, na segunda temos os conflitos que surgem quando uma banda rock composta por Cthulhu, Nyarlathotep, Yog-Sothoth e Shub-Niggurath se desagrega... porque Shub quer dedicar-se à música pop.
Há ainda um outro conto bastante divertido, "Cthulhu House", que parodia os reality shows actuais, com provas Lovecraftianas a serem ultrapassadas e com o bom e velho "Cully" a trabalhar como concorrente (sem grande sucesso, diga-se).
E não esqueçamos os resultados da passagem de Lovecraft pela escrita de textos para sortidos de chocolate!
Algumas das histórias ainda usam abordagens mais modernas, tais como o uso de Cthulhu para obter vitória nos desportos; a agência de viagens Alhazred; Cthulhu em versão vírus informático a destruir uma rede numa empresa e a desesperar o técnico dos computadores ou a tradução de textos do Necronomicon para linguagem corporativista.
A escrita dos contos, naturalmente, varia, desde estilo negro de horror típico dos Mitos a histórias com sabor a policial, passando, como referi, pelo humor (negro); a arte, de igual modo, também oscila um pouco entre estilos. Embora haja, naturalmente, variações, a qualidade geral tanto da escrita como da ilustração seja boa.
Cthulhu é o "protagonista" desta colecção, mas há lugar, como já perceberam, para muitos elementos da mitologia ao longo das páginas, alguns de forma mais óbvia, outros mais dissimulados.
Embora os contos tenham o que é preciso para agradar de modo geral a fãs do género do horror, sem dúvida que serão os apreciadores de Lovecraft (e colegas) que irão tirar mais partido desta BD.
Sem comentários:
Enviar um comentário